é uma conta sem fim: o artista
que se pinta pintando que se pinta pintando que se pinta... e por aí vai. pois
se o nariz de palhaço de cada um é o que chega antes, todo pranto, desdém ou ar
blasé, esconde atrás outro nariz de palhaço sobre outro pranto, desdém e ar
blasé atrás de... ufa! num clique, porém, o artista, não
menos hilário e complexo que sua “obra”, Márcio Nunes, captou tudo que pode
conter o ridículo de se despir, em todas as acepções da palavra, diante de uma
câmera. de posse apenas da tristeza e do secular artifício clownesco, nesse caso um nariz negro em sinal de luto, os amigos do
fotógrafo, além do próprio – foto da foto da foto etc. – encararam a lente para
um inusitado ensaio sobre a alma humana. como uma espécie de preparador de
elenco, sem os requintes de crueldade de uma Fátima Toledo, é claro, mas com a
persistência de quem, por conhecimento, sabe como arrancar o “melhor” de cada
“ator”, Márcio registrou em seu estúdio, diferentes “interpretações”, através
de rituais, os mais diversos. conta-se, por exemplo, que uma
famosa atriz (atriz mesmo!), já embriagada, ousou lanhar-se toda, possuída da emoção de sua
“cena”. à exceção da regra, teve moça que preferisse não cobrir os seios com as
mãos e marmanjo se recusando a tirar a camisa. houve ainda quem se debulhasse
em lágrimas, algumas expressões sisudas e até semissorrisos. não se trata, pois, de um retrato
fiel da angústia, mas um flagrante daquilo que não se revela, a imagem subliminar
entre uma e outra pose. não o que é invisível a olho nu, mas o próprio olho nu
quando distraído de si. quem, no entanto, como este que
vos fala, por timidez ou vaidade (no fundo a mesma coisa!), encarou tudo como
uma aventura estética, desviou do próprio olhar, recorreu ao cigarro e não se
permitiu ver exposto o íntimo de sua alma, certamente se saiu bem na foto... e bancou o palhaço, o que já não é pouco!
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